Como identificar falsas notícias


A comunicação social é hoje bem diferente daquilo que era há alguns anos, sobretudo pelo sucesso alcançado pelas redes sociais, de que o Facebook é um dos melhores exemplos. As redes de partilha de informação deixaram de se apoiar exclusivamente nos mass media clássicos (imprensa, rádio e televisão) e passaram a ter nas redes sociais um pilar importantíssimo. A informação propaga-se hoje a um ritmo elevadíssimo e, no meio deste turbilhão com um nível competitivo inédito, os agentes noticiosos "oficiais" debatem-se com a necessidade diária de serem os primeiros a obter e divulgar as notícias. Em consequência:

  • O tempo dispendido para validar a credibilidade dos factos apresentados na notícia é menor

  • A deontologia é muitas vezes desconsiderada face à urgência de mostrar trabalho e garantir leitores/audiência

  • Há um efeito "cascata" em que se um agente noticioso publica uma notícia inédita, validada ou não, muitos outros vão atrás e reproduzem-na, partindo do princípio que foi validada na fonte

Esta precipitação é de tal monta que, por vezes, até artigos satíricos são partilhados como sendo verdadeiros. Lembram-se de quando a cadeia televisiva RT difundiu a notícia de como a Roménia tinha enviado ajuda para o Tahiti em vez do Haiti? [Ver aqui]




Por outro lado, nas redes sociais cada utilizador tornou-se um agente noticioso não oficial, partilhando publicações que vai encontrado no seu "feed" de informações, cronologia se preferirem. O problema é que a validação da sua fiabilidade é geralmente nula e reveste-se de várias particularidades:


  • Não há obrigação deontológica de validar a credibilidade dos factos

  • As partilhas são sempre influenciadas pelas convicções e preconceitos de cada um e são motivadas, ou seja, estamos pré-condicionados para tomar como credíveis todas as notícias que vão de encontro às nossas convicções e preconceitos. 

  • As partilhas são motivadas pela necessidade viciante de obter "Likes", no fundo, de se sentir importante no seio da "comunidade virtual"

  • O fascínio do sensacionalismo, a pressa em obter "Likes", e, por vezes, uma certa preguiça, fazem com que a partilha se faça de forma precipitada, apenas com base na leitura do título e poucas vezes se lê, como sempre deveria acontecer, o corpo da notícia

  • A partilha raramente avalia as motivações políticas ou sociais de quem publicou originalmente a notícia


Todo este conjunto de factores cria o eco-sistema ideal para o surgimento e proliferação de notícias falsas ou, "como se diz em americano", as Fake News. Esta é uma praga que infesta a sociedade de informação actualmente e frequentemente ultrapassam, em termos de alcance, a verdade dos factos. Por outro lado, quando se descobre que uma notícia é falsa, o alcance do seu desmentido é irrisório quando comparado com o alcance que a notícia atingiu inicialmente. Porquê? Porque, desprovido que é de sensacionalismo, a motivação para a partilha de um desmentido é muito menor.


Cada um é responsável por aquilo que partilha!

De facto, mesmo que não sejamos autores de uma determinada notícia falsa, o facto de a partilharmos torna-nos parcialmente responsáveis pela sua existência e pelas suas consequências, que em casos extremos podem ser trágicas. 

Um caso que ficou célebre foi o do Pizzagate, nos Estados Unidos no qual, devido a um boato que se tornou viral, um homem invadiu uma pizaria e disparou vários tiros porque acreditava que esta era o local de tráfico de crianças por pedófilos ligados ao partido democrático [Ver aqui].

No Brasil, um rumor que se tornou viral, levou ao linchamento de uma mulher que tinha sido transformada numa raptora e abusadora de crianças. [Ver aqui]

As falsas notícias que mais frequentemente vejo serem partilhadas têm a ver com:
  • conteúdos raciais
  • conteúdos religiosos
  • conteúdos políticos
  • teorias da conspiração

Os actos de vandalismo de um grupo de hooligans adeptos do Basileia (na Suíça) transformou-se em supostos actos de violência por parte de muçulmanos que queriam impor o respeito pelo Ramadão em Birmingham, no Reino Unido [imagem tirada daqui]

Quando vemos uma notícia que provoca em nós uma reacção emocional, o primeiro impulso será de a partilhar imediatamente. É precisamente nesse momento que devemos ter a capacidade de refrear esse impulso e de colocar a questão fundamental: "Será que isto é verdade?"


Como identificar notícias falsas?

Quando me deparo com uma notícia partilhada que chame de alguma forma a minha atenção pelo seu título e que levante algumas suspeitas, sigo sempre o mesmo método de avaliação:
  1. Abrir e ler a notícia. O título está em harmonia com o seu conteúdo? Cita fontes? Aproveitem também para verificar a data da publicação.

  2. Analisar o site em que está publicada. É um site fiável? Qual é o sentido geral das suas publicações (pode ser satírico, política ou religiosamente tendencioso, ...)?

  3. Fazer uma pesquisa pelas fontes citadas. Existem? São quem a notícia diz serem?

  4. Procurar a notícia noutras fontes de informação, nomeadamente em sites informativos credíveis, como canais de televisão ou jornais on-line. Se não encontrarmos a notícia em nenhum deles, será bastante suspeito.

  5. Partir do princípio que a notícia é falsa e pesquisar no Google como se assim fosse. Usando o exemplo dos hooligans suíços que atrás referi, o método que usei para descobrir que se tratava de fake news foi simplesmente o de fazer uma pesquisa no Google com os termos "Ramadan riot Birmingham fake" ("Ramadão tumulto Birmingham falso")
  6. Copiar uma frase da notícia suspeita e pesquisá-la, colocando-a entre aspas, no Google
  7. Suspeitar de todas as partilhas que sejam acompanhadas de frases como "Esta publicação está a ser censurada! Partilhem antes que o Youtube ou Facebook elimine este artigo outra vez!"

Claro que nem todas as partilhas são de artigos. Muitas vezes são fotografias acompanhadas de uma descrição e é mais difícil verificar a origem desta. 

O caso bem conhecido de uma imagem partilhada com falsa descrição. Tornou-se viral por representar supostamente o êxodo de europeus para África durante a II Guerra Mundial mas, na verdade, representa a fuga de dezenas de milhares de albaneses para Itália nos anos 1990. [Imagem tirada daqui]


Diferentes imagens com a mesma credibilidade:

Uma frase atribuída a Catarina Martins e publicada no Jornal Expresso que, pelos vistos, na semana em questão foi publicado... à Quarta-feira! Uma pesquisa no Expresso on-line não deixa dúvidas quanto à não-existência desta frase.


O cartão de Fernando da Silva Pais, director da Pide, foi transformado no "cartão de informador" de Cavaco Silva


Neste cartão de membro da FNLA, a identidade de Peter McAleese foi substituída pela de Manuel Alegre


No entanto também há formas de despistar a sua credibilidade, sendo a mais simples a de fazer uma pesquisa de imagens no Google
  1. Abrir a imagem num novo separador (Botão direito do rato - Abrir em novo separador) e copiar o endereço da imagem da barra de endereços do nosso navegador
     
  2. Fazer uma pesquisa de imagens no Google, pesquisando pelo endereço da imagem. O Google vai procurar imagens visualmente semelhantes e apresentar os sites onde elas se encontram. Se os factos da partilha forem falsos, será possível encontrar na lista de resultados o seu contexto original ou o desmentido da falsa legenda.

É claro que haverá partilhas cuja veracidade será difícil de validar mesmo com todas estas etapas de verificação mas garanto que a grande maioria das falsas notícias será facilmente detectada desta forma. Dá algum trabalho mas vale a pena até porque, como referi atrás, cada um de nós é responsável por aquilo que partilha, tanto pela sua veracidade como pelas suas consequências.

Já agora, para terminar, gostava também de ter algum feedback vosso. Quais são as formas de verificação da veracidade das notícias que utilizam? Acham que esta lista é completa ou falta alguma coisa?



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