“Um dia vamos ser todos assim”

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Há dias, no decurso de uma tertúlia entre amigos, veio à baila o tema das religiões e da forma como cada credo procura espalhar a sua fé. Inevitavelmente, sobreveio o tema da evangelização através do porta-a-porta que as Testemunhas de Jeová praticam, e no qual tomei muitas vezes parte ao longo da vida na qualidade de indivíduo julgado admissível por esta comunidade religiosa.

Aproveito desde já para dizer que este artigo não constitui de forma nenhuma uma expressão de reprovação contra este credo. Aliás, sou um confesso admirador da coragem de quem não poucas vezes leva com o mau humor de quem é interpelado, não menos vezes salpicado de palavrões próprios de quem foi acordado a um Domingo de manhã, e ainda assim persiste de forma inabalável no modus operandi que lhe é ditado pelas suas convicções. Eu não seria capaz de tamanha persistência e percebi-o logo quando era ainda um magricelas petiz de cerca de 12 anos e fui incumbindo por um professor, creio eu de Religião e Moral, de vender autocolantes em prol da luta contra a lepra nos países africanos. Levei uma nega logo à primeira e isso abalou-me de tal modo que paguei todos os autocolantes do meu bolso para não me sujeitar a nova situação de enxovalho sobre tapete alheio e para, por outro lado, não passar por incapaz perante o dito professor.

Mas voltando às recordações que guardo de situações em que fui interpelado em acções de pregação, há um episódio em particular que se destaca e que aconteceu numa das muitas tardes de Sábado em que prestei serviço ao balcão do estabelecimento comercial dos meus pais.

O sossego dessa tarde foi quebrado pela entrada de uma senhora, vizinha do estabelecimento, que trazia umas publicações na mão e que, dirigindo-se a mim, me atirou o tão tradicional –“Oh David, já que tens tempo, eu trago-te aqui uma leitura para leres com muita atenção. Isto é importante.” Sem me dar tempo de responder, virou a capa de uma das revistas para mim, capa essa que tinha uma bela imagem de um cenário paradisíaco, no qual num extenso prado verde e florido, emoldurado por florestas e montanhas, seres humanos brincavam em harmonia com uma panóplia de animais de diferentes morfologias.

Com a capa virada para mim, apontou sem olhar para a imagem e continuou – “Sabes, quando Nosso Senhor vier, nós iremos todos ser assim!”. Como na altura futuro era já uma fonte importante de preocupações da minha parte, dirigi o olhar para o ponto onde o seu dedo levantava e pousava sobre a imagem, na procura de chamar a minha atenção.

Sob a ponta do dedo da minha interlocutora, um belo exemplar de um urso erguia-se sobre as patas traseiras embora exibisse uma expressão que se poderia classificar como sendo de sorridente.

Tão peludos!…”, foi a única frase que eu consegui proferir.

Imagem (que nada tem a ver com o texto): Discovery News

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