Europeias 2009: Vitória da Abstenção


O apuramento dos resultados das eleições para o Parlamento Europeu acabou por ser mais animado do que o previsto pois, pela primeira vez desde há muito tempo, houve um partido que efectivamente assumiu a derrota nos resultados: o Partido Socialista. Tratou-se de uma atitude arrojada que me surpreendeu em absoluto. Aliás, a própria campanha do PS foi toda ela uma surpresa pois, até este momento, continuo sem saber com o que é que se parece o Cabeça de Lista que os socialistas escolheram para mais este duro "combate eleitoral".

Permitam-me só um aparte acerca da expressão "combate eleitoral" que é uma expressão que eu aprecio particularmente. Em primeiro lugar acho fascinante o emprego recorrente da expressão "combate eleitoral" no contexto de eleições, visando deixar no ar uma ideia de lutador heróico e destemido que, tal como a voz dos nossos egrégios avós, vai guiar-nos à vitória. Olhando contudo ao "combate" que os candidatos realizam efectivamente, entre o percorrer corajosamente o país de lés-a-lés, de modo a estimular o sector de comercialização de combustíveis e o sector de produção de brindes publicitários, e o sentar-se corajosamente frente aos tirânicos pratos de feijoada e petiscos associados, acho que o acto de maior coragem será mesmo o beijar das senhoras que efectuam a venda a retalho de pescado e outros frescos de origem aquática. Não consigo pois expulsar esta ideia incómoda que ver um candidato empregar o termo "combate eleitoral" é como ver Teletubby vestir uma armadura.

Bom, como eu dizia antes desta curta dissertação, continuo sem saber com o que é que se parece o Cabeça de Lista do Partido Socialista. Em primeiro lugar porque, confesso, não estive muito atento aos primeiros cartazes e outdoors do PS e, curiosamente, os subsequentes apenas continham fotografias de outras pessoas para no final apenas apresentarem texto (provavelmente uma clara afirmação de confiança na política de educação do Governo). Em segundo lugar porque, após um visionamento mais atento da parte final da campanha, fiquei ainda mais na dúvida. Dias houve em que eu poderia jurar que o senhor era alguém extremamente parecido com um antigo cantor e que fazia do abundante uso de laca Sunsilk um hábito predominante. Contudo, noutros dias, fiquei com a ideia que era um indivíduo extremamente parecido com o nosso Primeiro Ministro, o Sr. Eng. José Sócrates, que falava como o nosso Primeiro Ministro, o Sr. Eng. José Sócrates, e que - imagine-se! - até usava e abusava da ironia pincelada de cinismo do nosso Primeiro Ministro, o Sr. Eng. José Sócrates! Um nunca acabar de emoções, portanto, este comportamento do PS nas Europeias 2009...

Do lado do PSD clamou-se vitória e com alguma razão afinal obtiveram menos votos que nas eleições anteriores, quando concorreram coligados com o CDS-PP, e praticamente o mesmo número que em 1999, ambos actos eleitorais em que foram sumariamente derrotados, mas ainda assim elegeram mais deputados que qualquer outro partido. Na sede do PSD, num discurso que a JSD parecia querer boicotar ao querer mostrar uma encenação de um certo sketch dos Gato Fedorento, Rangel atribuiu o protagonismo da vitória a Manuela Ferreira Leite. Se pensarmos que à Dra. Ferreira Leite bastou apenas passear ao lado do Cabeça de Lista do seu partido, limitando-se a sorrir e a acenar, para obter praticamente os mesmos resultados de sempre do PSD nas Europeias, então talvez essa dedicatória não seja descabida.

De resto quero apenas deixar aqui uma palavra de admiração pelo PNR Tratando-se de um partido tradicionalmente vencedor se omitirmos o facto de estarmos a avaliar a lista de resultados ao contrário, o PNR arrancou para esta campanha com uma arrojada operação de cosmética substituindo o epíteto de "Nacionalistas" por um devastador "Soberanistas", procurando sem dúvida surpreender e deixar confuso o eleitorado que estava convencido que, para aderir à militância no PNR, era necessário passar previamente pelas mãos hábeis de um cabeleireiro com insectofobia. Prosseguindo uma linha coerente com a sua oposição à integração na UE, o PNR alcançou pois uma grande vitória ao garantir que não vai participar desse atentado à soberania lusa que é o Parlamento Europeu.

(Obrigado Sãozinha!!)

A verdadeira vitória destas eleições cabe contudo à Abstenção que obteve um resultado esmagador de 63%. Pode-se dissertar amplamente sobre as causas da abstenção: desencanto com a política portuguesa, eternização das mesmas figuras políticas, necessidade de incutir espírito de mobilização ou até mesmo necessidade de não fazer coincidir actos eleitorais com fins-de-semana ensolarados. Tenho para mim que a abstenção é a mais pura manifestação de irresponsabilidade democrática do Português que, usando desculpas fáceis, se acha legitimado para ficar em casa efectuando a fricção das suas micoses ou, em contrário, para aproveitar esta oportunidade de compensar uma até aqui fraca produção de Vitamina D por défice de exposição solar ou para ir mostrar o seu novo guarda-roupa ao centro comercial mais próximo.

Perdoai-lhes Capitães pois eles não sabem o que custou...

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