Os medos de Assunção Esteves (com vídeo e tradução)

No início do ano, a Rádio Renascença foi ouvir aquela que é a 2ª mais importante figura do Estado Português, a Sra Presidente da Assembleia da República, para saber quais eram os seus desejos e medos para 2014. O depoimento ficou registado na forma de um vídeo que só hoje tive oportunidade de ver.

Este vídeo, posso-vos dizer, consiste em 3'36'' de um tremendo exercício criativo de utilização da Língua Portuguesa, exercício esse que nos faz perceber que certas personalidades, como o ex-Presidente da República Jorge Sampaio e o treinador de futebol Manuel Machado, não são afinal tão especiais como nós julgávamos que eram.

Vi e revi o vídeo e, usando palavras da protagonista, devo dizer que inconsegui o percebimento pleno da mensagem, o que me remete de certa forma a um nível frustracional. Seja como for, como sou contra o egoísmo (especialmente no que toca à castração, seja ela pessoal ou colectiva), aqui fica o trecho mais saboroso do depoimento da senhora Presidente da Assembleia da República.




Transcrição e tradução

Para ajudar aqueles que também tiverem inconseguido o percebimento daquilo que Assunção Esteves tentou dizer, tomei a liberdade de fazer a transcrição das suas palavras (sem cortes):

O meu medo, eu formulá-lo-ia de modo abstracto, é o do inconseguimento, em muitos planos. Do inconseguimento desde logo de não ter possibilidade de fazer no Parlamento as reformas que quero fazer. De as fazer todas. Algumas estão no caminho. O inconseguimento de eu estar num centro de decisão fundamental a que possa corresponder uma espécie de nível social frustracional derivado da crise. Isto é, os momentos difíceis também nos dão oportunidades de sentirmos a nossa missão humana no Mundo. Mas também tenho medo que a crise não me permita até espaços de energia para ser mais criativa. Há sempre esse medo. É também o do não conseguimento.

E tenho medo do conseguimento ainda mais perverso: o da Europa se sentir pouco conseguida e de ela não projectar para o Mundo o seu soft power sagrado, a sua mística dos direitos, a sua religião civil da dignidade humana. Tenho medo do egoísmo. Tenho medo do egoísmo que nos deixa de certo modo castrados em termos pessoais e que nos deixa castrados em termos colectivos, que não permita aquilo que os franceses chamam réussir, o conseguimento. O conseguimento pessoal e colectivo. Tenho medo do não conseguimento.

O que em bom português se traduz por:

Tenho um certo receio de fazer asneira lá no meu trabalho, no Parlamento. Queria fazer por lá umas alterações que vi no programa televisivo "Querido mudei a casa" mas não sei se as vou conseguir fazer todas ,até porque o povo está sempre a ir lá chatear-me, queixando-se da crise, e tenho de estar sempre a mandá-los sair. Gostava de arranjar uma forma mais criativa de expulsar aqueles traquinas das galerias mas a instalação de cadeiras com sistema de ejecção iria pesar muito na factura da energia.

Por outro lado tenho medo que as coisas dêem para o torto sempre que o pessoal se junta em Bruxelas. Ainda por cima, por causa dos cortes no orçamento, tivemos de cortar nas bebidas energéticas e agora só temos Red Bull sem açúcar, que também dá power, é certo, mas um bocado mais soft. Por causa disso, alguns colegas começaram a organizar festarolas privadas. Há tempos, o Schäuble trouxe umas sobras da última Oktoberfest e fez uma festa lá no hotel mas não convidou o Passos Coelho. Este ficou tão irritado que até veio dizer que aquilo era um bando de eunucos e que mais depressa o desproveriam a ele das suas partes pudendas do que voltaria a apertar a mão àquele alemão ingrato.


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