Quando pedirem indicações rodoviárias nunca digam que são do Fundão


Todos estamos acostumados ao excesso de zelo que os habitantes locais põem em prática quando paramos para pedir indicações sobre o percurso a seguir até uma determinada rua ou povoação. Quem não se deliciou já (ou ficou mais baralhado) com o atropelo de indicações dadas por quem nos quer informar de todos os caminhos possíveis em direcção ao local onde pretendemos chegar? Eu próprio que o diga quando há uns anos cometi o erro de pedir indicações a um grupo de 20 cidadãos idosos na aldeia de Fornotelheiro. Ainda assim, experimentei há dias uma situação completamente diferente.

É claro que eu poderia ter logo percebido que a coisa não ia correr bem quando, ao procurar a Avenida General Humberto Delgado na localidade de Canhoso, junto à Covilhã, o GPS respondeu de forma seca que a mesma não existia. Ainda assim, movido por uma teimosia que me está lavrada no código genético, própria da gens Caetano, fui até ao Canhoso para procurar a empresa que as minhas pesquisas na web haviam situado nessa avenida e nessa localidade.

Após 15 minutos às voltas pela povoação sem conseguir encontrar a referência toponímica que procurava, decidi usar o antigo e infalível método de indagar a população indígena que, pensava eu, certamente me dirigiriam para a dita avenida. Encostei pois a viatura e abri a janela do lugar do passageiro, abordando um trio de indivíduos que teriam entre 50 e 60 anos.

-"Boa noite! Será que me poderiam indicar onde fica a Avenida General Humberto Delgado?"

O mais expedito de entre eles tomou a iniciativa de responder: - "Avenida quê? Oh amigo, isso não é cá no Canhoso. É ali na Covilhã!", resposta que deu início a um diálogo entre eles sobre qual seria a avenida com esse nome na Covilhã. Consensualmente, concluíram e informaram-me que se trataria de uma avenida que circundava o cemitério da Covilhã.

Já em jeito de despedida quis saber de onde eu era, ao que respondi que era do Fundão. A mudança do seu rosto para uma expressão de um misto de choque e revolta foi impressionante:

-"Do Fundão?! F###-SE! Do Fundão?! Ai o C######! F###-SE! Oh amigo, do Fundão nem cão, nem esposa nem nada! Há uma empresa do Fundão que me deve 64.000 euros, oh meu amigo! 64.000 euros!"

Subitamente, abriu muito os olhos e deu dois passos atrás, enquanto dizia exasperado -"Espere lá! De que firma é este carro? Hein? De que firma?", enquanto mirava o meu carro de ponta a ponta, procurando a identificação da empresa à qual ele pertencia. Tranquilizei-o dizendo que, apesar de eu ser do Fundão, a empresa à qual pertencia não o era, acrescentado que houvera ali um momento em que chegara a recear ter de voltar a pé para casa.

Quiçá devido ao alívio de não estar perante um agente de um caloteiro, o indivíduo foi tomado de um novo voluntarismo e, pegando no telemóvel, pediu-me para esperar um bocadinho -"Espere aí. Vamos mas é ligar para a PSP que eles devem saber onde fica essa rua!". Não contente pela resposta dada pela PSP, que contrariou as suas convicções e o informou de que afinal a Avenida General Humberto Delgado não existia na Covilhã (e no Canhoso também não, já agora), fez nova chamada mas desta vez para a GNR.

Aqui a resposta foi quase imediata: a dita avenida era afinal a artéria principal do Canhoso, que no GPS era referida como "Rua João XXIII". Desligando, apontou para a avenida que dali se avistava ao fundo da rua e exclamou: "É aquela oh amigo!". Despedi-me com um cordial e sentido agradecimento, não deixando no entanto de acrescentar: "Já viram? É preciso vir um gajo do Fundão para vocês aprenderem o nome das ruas do Canhoso!".

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